Excetuando os elementos de origem natural, é possível afirmar que tudo o quanto existe no mundo é fruto da criatividade do homem, de sua inteligência. Não há como contemplar o mundo de hoje sem deixar de se surpreender com as conquistas alcançadas ao longo da história. A inventividade envolvida nos avanços científicos e tecnológicos parece ignorar os limites da imaginação. A criatividade humana é instigada continuamente a encontrar soluções para novos e velhos desafios. Inovações engenhosas são aplicadas nas diversas áreas do conhecimento, aprimorando o que já existe, ao mesmo passo em que novas e surpreendentes descobertas tornam a existência do homem mais confortável, segura e integrada. Neste cenário erguido ao longo de séculos de civilização, é possível distinguir exatamente quando, onde e de que forma surgiu cada uma das coisas que conhecemos. Documentos registram o início de cada movimento social, religioso, científico e tecnológico, permitindo que cada um conheça exatamente o ponto em que a maioria das coisas teve origem. Este trabalho persegue preencher uma importante lacuna na investigação científica sobre o surgimento da inteligência em humanos. Seu teor não sugere absolutamente nenhuma definição sobre o que venha a ser a inteligência, mas sim a forma com que a mesma tenha se desencadeado no homem primitivo. Uma iniciativa como esta exige a inclusão de novas proposições e minúcias, visando agregar elementos que possam contribuir para o debate de um evento muito importante na história do homem. A contribuição do estudo pode ser compreendida pelo o incremento de conexões de eventos cruciais do passado, até então pouco relacionados entre si. O limiar da inteligência representa um enigma com o qual muitos já se depararam. De fato, não há uma teoria consistente, capaz de supor de que forma teria surgido a inteligência humana. Um fato surpreendente, considerando o alto grau de desenvolvimento científico e tecnológico alcançados até então. Motivo de controvérsias e especulações ao longo dos séculos, esta inconveniente lacuna ainda separa correntes acadêmicas em calorosos debates. A ausência de uma teoria aceitável acaba permitindo que se prosperem suposições fantásticas e uma vasta lista de explicações de cunho puramente especulativo, repletas de argumentos pouco factíveis. Entre os estudos existentes, é possível destacar algumas pesquisas recentes que procuraram associar o surgimento da inteligência no homem ao acesso que seus ancestrais tiveram a alimentos ricos em ômega três. Apesar das reconhecidas propriedades desses alimentos e sua importância para o desenvolvimento de cérebro, esta teoria esbarra em uma série de limitações. A princípio, seria muito difícil comprovar que parte significativa dos ancestrais do homem teve acesso ou mesmo se desenvolveu próximos ao litoral. É notório que a maioria dos alimentos ricos em ômega três tem origem no mar, obtido através do consumo de certas espécies de peixes e crustáceos. Deste modo, os habitantes da parte central do continente teriam poucas chances de desenvolverem algum tipo de inteligência. De mesmo modo é possível avaliar que o argumento sugere que o maior acesso á proteínas oriundas das caças abatidas seja uma teoria palatável. Afinal, outros animais carnívoros permanecem nos dias de hoje com o volume de massa cerebral inalterado, como há milhões de anos. É preciso destacar o relevante consenso no meio acadêmico sobre um requisito básico para a aquisição da inteligência, que consiste na contabilidade de uma “massa crítica” de neurônios, o que relaciona e condiciona fisicamente a inteligência ao volume do cérebro. Entretanto, não foi possível a outros teóricos indicar um fator coerente sobre como precisamente o homem adquiriu o volume necessário do cérebro para abrigar a inteligência. Este trabalho não tem por objetivo realçar a consistência de teorias existentes. Estudos importantes estão em curso neste exato momento. Certamente, o conjunto destes esforços irá contribuir para a construção de cenários cada vez mais claros para a melhor compreensão de um evento tão extraordinário. E é exatamente a necessidade de integrar importantes campos do conhecimento científico que possibilitem a construção de um novo raciocínio sobre a origem da inteligência no homem que impele o surgimento de novas contribuições. Esta iniciativa representa apenas mais um passo nesta caminhada. O ponto de partida está há alguns milhares de anos na história da humanidade. Será bastante útil reavaliar conceitos estabelecidos sobre alguns importantes aspectos das teorias da evolução através dos tempos. Contabilizar as importantes descobertas para que esta breve jornada resgate indícios essenciais de uma nova compreensão dos fatos.
Importantes Etapas na Evolução da Espécie Com seus sete milhões de anos, O Sahelantropus Tchadensis encontrado ao norte do Deserto de Chade, na África saheliana, é provavelmente o representante mais remoto da humanidade de que se têm notícias até os dias de hoje. Sucessor de antepassados mais primitivos e distantes, este hominídeo encontrado por uma expedição Franco-africana pode significar um importante elo entre os espécimes antecessores de anatomia tipicamente símia e seus sucessores que caminhavam em direção á uma configuração humana.
A linhagem evolutiva do homem passaria ainda por inúmeras experimentações ocasionadas pela natureza através de seus sucessivos desafios. Centenas de exemplares de fósseis foram encontrados ao longo do século passado em sítios arqueológicos, sobretudo na África, comprovando a teoria concebida por Charles Darwin de que aquele continente teria sido o berço da humanidade. Avaliar transformações ocorridas ao longo de milhões de anos pode ser uma aventura bastante audaciosa, considerando os parcos anos de civilização. Apenas nestes últimos dez mil anos, o homem conseguiu aperfeiçoar seus recursos lingüísticos, constituiu cidades, dominou o mundo natural através da ciência e saltou para um grau de desenvolvimento extraordinário como o que pode ser observado nos dias de hoje. Entretanto, o que teria patrocinado o surgimento de tantas possibilidades cognitivas? O que teria favorecido ou desencadeado o processo de evolução do cérebro, o volume de sua massa e conseqüentemente o surgimento da inteligência? Talvez seja necessário rever, passo a passo, algumas características da evolução que culminariam no alto grau de aperfeiçoamento alcançado pelo ser humano dos dias de hoje. Tornou-se consensual afirmar que as diferentes etapas evolutivas alcançadas pelo homem ao longo de sua evolução ocorreram basicamente em virtude de grandes transformações ocorridas na terra. Evidências bastante concretas indicam que essas transformações, conhecidas como funções adaptativas, produziram espécies de diferentes configurações nos indivíduos a fim de torná-los aptos a enfrentar os novos desafios que surgiam. Uma dessas transformações ou mutações adaptativas sofridas pelo homem, praticamente o único ser entre todas as demais espécies, seria a evolução do modo como se locomoviam. Em determinado momento de sua jornada, alguns indivíduos começaram a se locomover do modo diferente. As condições adversas ao desenvolvimento humano sempre existiram e algumas ainda persistem nos dias de hoje. Porém no passado, os correspondentes do homem ainda não possuíam o grau de inteligência presente em seus pares da atualidade. Deste modo, sua limitada engenhosidade não lhe permitia se esquivar dos grandes desafios a que era submetido, a não ser adaptando seus dispositivos físicos e biológicos ao longo de gerações e gerações. Do mesmo modo ocorre com o restante dos animais até hoje. Alterações climáticas significativas marcaram as diferentes etapas do desenvolvimento de cada espécie. Essas alterações interferiam em praticamente todos os aspectos que envolviam a existência do indivíduo. A disponibilidade de alimentos, a oferta de caça e o número de predadores naturais eram obstáculos que representavam apenas uma parte dos desafios a serem vencidos. Havia ainda as doenças, a necessidade de se deslocarem para regiões onde o alimento era mais abundante, além das limitações hereditárias impostas pelo pequeno número de representantes de cada espécie. Um significativo conjunto transformações desencadearia o processo irreversível do início da inteligência no homem. Este é um fato que pode ser facilmente aferido em virtude de seu grau de especialização a partir de então. Foram necessários milhões de anos para que o homem alcançasse este ponto fundamental em sua heróica e, por que não dizer, emocionante jornada. Sim, por que cada pequeno desafio vencido, cada pequeno sacrifício em prol da continuidade se somaria a um conjunto hercúleo de esforços que permitiria o pleno desenvolvimento de gerações futuras, garantindo assim, à custa de instintos elementares, à maciça predominância do homem sobre o planeta. Curiosamente, o fato mais relevante em toda sua existência e uma das principais características que passou a diferenciá-lo das demais espécies, seria justamente aquele que desencadearia todo o processo do surgimento da inteligência humana: O advento da verticalização da espécie, ou o momento em que um antepassado remoto adotou a postura bípede. Este teria sido o ponto ou o agente patrocinador do enriquecimento da capacidade cognitiva no homem. Sim, este foi o principal evento que culminaria no surgimento dos primeiros indícios da inteligência humana: O fato do homem adotar a postura ereta. Surgiam então os primeiros indícios de um tipo de inteligência totalmente diferente de demias formas existentes até então. Esta nova forma de inteligência se aprimoraria continuamente, alcançando elevados níveis de desenvolvimento intelectual. Aquilo que parecia pequeno passo para aqueles indivíduos representaria um enorme salto para a humanidade. A associação entre o surgimento da inteligência e o advento da verticalização possui uma série de elementos bastante complexos. A seguir, argumentos que constituem um conjunto significativo de evidências de um forte vínculo entre uma coisa e outra (inteligência e andar em pé). De certo modo, não há como dissociar o desenvolvimento do aparato cognitivo como resultado do processo evolutivo. Surge então a necessidade de precisar alguns eventos e cenários que teriam sido capazes de desencadear todo esse processo. Estudos indicam que o surgimento da peculiaridade do andar bípede pode ser atribuído ao Australopitecus amanensis há aproximadamente quatro milhões de anos. O australopitecus Aferensi teria caminhado sobre as planícies africanas por volta de três milhões de anos atrás, sendo sucedido pelo Homo-Habilis, que teria surgido há cerca de 2,5 milhões de anos. Entretanto estes não são ainda, assim como outras variações da linhagem evolutiva, representantes diretos do gênero humano, por assim dizer. Existem vínculos mais robustos da linhagem moderna do homem apenas a partir do Homo Erectus, Homo Sapiens Arcaico (500 mil anos) e finalmente o Homo Sapiens Moderno (100 mil anos), que talvez tenha sido o último a alcançar o processo de verticalização plena a julgar pelo seu alto grau de especialização.
A partir de então, indícios de sua inteligência foram encontrados em conjunto com vestígios de sua presença durante expedições arqueológicas dos séculos dezenove e vinte. Sítios arqueológicos revelaram fartos materiais, desde instrumentos feitos de ossos, apetrechos rudimentares e pinturas rupestres no interior de cavernas, entre outros artefatos. Os exemplares humanos responsáveis por estas façanhas supostamente teriam alcançado a Ásia há cerca de 50 mil anos e a Europa há aproximadamente 30 mil anos. Apesar das controvérsias sobre a precisão das datas, os elementos que comprovam o surgimento de inteligência na espécie foram encontrados em praticamente todos os continentes. É possível afirmar que o início desta nova manifestação intelectual tenha ocorrido simultaneamente entre os povos. A adaptação bípede Existem vários estudos sobre o que teria forçado o homem a adotar o bipedalismo. Teorias complexas e bem articuladas especulam que após um período de glaciação, extensas áreas ficaram alagadas, forçando os ancestrais do homem a andarem eretos para atravessarem planícies alagadas entre um ponto e outro. Outras teorias destacam que a desertificação de grandes áreas teria forçado os indivíduos a migrarem de uma floresta à outra atravessando extensos territórios sem vegetação. Uma outra teoria defende que o homem teria adotado a posição ereta a fim de minimizar os efeitos do sol sobre o próprio corpo, uma vez que grande parte da energia que consumida servia apenas para refrigerar o organismo, mantendo a temperatura do corpo e do cérebro próxima do ideal. Uma vez ereto, a área do corpo a sofrer a incidência da luz do sol era bem menor que a possibilidade oferecida pela posição horizontal do corpo. Outros defendem que a adoção da posição bípede pode estar vinculada ao contínuo aperfeiçoamento do ato sexual e à reprodução. Enfim, são muitos raciocínios que especulam quanto ao verdadeiro motivo que teria levado o homem à posição ereta. Todos parecem fazer algum sentido e é mesmo possível que a combinação de todas essas teorias tenham efetivamente contribuído para a verticalização do homem. Entretanto, o objetivo deste estudo consiste em tentar descortinar o importante acontecimento que este evento desencadearia. Sobre os aspectos conhecidos acerca do passado da humanidade, é possível afirmar que o bipedalismo, assim como outras transições sofridas pelo homem ao longo do processo evolutivo, tenha tido também suas etapas adaptativas. A postura mista, ou intermediária entre uma condição e outra, certamente representa um fenômeno ignorado por muitos estudos. As definições dos conceitos que abordam o bipedalismo até o presente momento podem dar a entender que este tenha sido um acontecimento instantâneo, deixando a idéia de que o homem tenha ficado ereto subitamente, sem considerar as diferentes etapas do processo que culminariam com o bipedalismo pleno. A princípio, a combinação de posturas, apesar de indicar o início do bipedalismo, não significa na prática o início do bipedalismo pleno. Talvez o ancestral humano tenha alcançando a posição plena e definitivamente ereta há bem menos tempo que até então se poderia supor. Apesar dos indícios ósseos observados em fósseis encontrados indicarem uma arquitetura projetada para o bipedalismo, não é possível precisar o grau ou ângulo de verticalização experimentado pelos indivíduos em vida. É possível inclusive correlacionar o grau de aptidão dos indivíduos em função de seu grau de verticalização. Basta observar o período de tempo em que a engenhosidade humana começou a atingir níveis cada vez mais significativos ao longo de sua evolução.
Indícios do surgimento de processos superiores de cognição
O evento da verticalização, ou bipedalismo pleno, naturalmente significa um verdadeiro privilégio do homem em comparação com outros seres vivos. Em princípio, esta tese visa alinhavar que a condição ereta implica numa série de fatores e transformações que irão culminar no desenvolvimento de processos superiores da cognição ao longo dos próximos milênios e o rompimento com os processos cognitivos elementares que orientaram ancestrais primitivos. É mesmo possível enumerar alguns desses cenários suplementares, associando-os a elementos que favoreceram francamente a possibilidade de aprimoramento das faculdades mentais patrocinados pelo advento do bipedalismo.
1) – Agora de pé, o homem experimenta uma nova perspectiva do mundo que o cerca. Esta condição altera dramaticamente sua senso-percepção. Passa a desfrutar de uma ótica bem mais rica que a de seus ancestrais que se locomoviam com os quatro membros. Limitados a uma área visual bastante restrita do ambiente, a posição rasteira os tornava mais vulneráveis às possíveis ameaças. Esta nova posição ofereceria uma perspectiva visual privilegiada. Mesurar cada aspecto desta mudança exigiria uma série de demandas dos centros de processamento das informações visuais. Obviamente, a condição ereta forçaria o desenvolvimento de áreas do cérebro responsáveis pelo equilíbrio e aprendizagem de novos movimentos corporais, além da adaptação à suas novas limitações. De agora em diante, seria necessário planejar os movimentos de modo mais elaborado. Isso passou a representar mais exercícios para a memória e, conseqüentemente, maiores demandas para a parte frontal de cérebro. Esta condição implica ainda na sofisticação do fluxo de funções cognitivas espaciais, motoras e de orientação. O processo de aprendizagem, a tarefa de administrar funções cada vez mais complexas e movimentos mais elaborados são aspectos que passaram a exigir maior coordenação sensorial. Toda esta atividade demandaria a disponibilidade de maior poder de processamento para organizar um volume cada vez maior de informações. A necessidade de retenção dessas informações para aplicações futuras exigiria maior capacidade de memorização. Esta nova rotina de atividades a serem coordenadas representa uma nova série de correntes de variações sinápticas entre os neurônios, fenômeno que constitui um importante grupo de traços de memória, quando são criadas novas vias para a transmissão neural. É quando ocorre o surgimento de memórias de níveis mais duradouros como as de médio e longo prazo, ricas em números de receptores e neurotransmissores. Como as informações provenientes do mundo interior e exterior são armazenadas quimicamente nos neurônios, subentende-se que o volume destes teria que ser cada vez maior. Agora de pé, podendo enxergar mais longe, torna-se possível aferir valores mais complexos para parâmetros como distância e tempo. Além do fato de estar dotado de um par de olhos alinhados frontalmente, o que lhe garante uma visão estereoscópica, o homem é ainda capaz de enxergar em três dimensões e em cores, devido aos seus hábitos diurnos. A condição ereta favoreceria virtualmente suas ricas potencialidades visuais. Sua nova e privilegiada perspectiva do ponto de observação passa a oferecer um panorama mais detalhado do ambiente, o que requer um estudo mais detalhado da área como um todo, sugerindo a necessidade de planejamento de movimentos, cálculos de distância e tempo a ser consumido de um ponto ao outro. Dentro do cérebro, a retenção de grande parte dessas informações passa a provocar uma série de reagrupamentos morfofuncionais, realçando cada vez mais os traços das memórias. Considerando que a alteração da consciência corporal por si só já seria responsável por um grande enriquecimento das conexões neurais, uma vez que esta passou a exigir a contínua reorganização da representação espacial, através de aperfeiçoamentos da condição neuro-sensorial, Esta condição exigiria ainda a formulação de raciocínios mais complexos, culminado na criação de novas conexões neurais, a fim de atender a necessidade de equalizar esses novos desafios impostos pela posição vertical. Todos estes novos exercícios podem ser traduzidos em benefícios imediatos ao desenvolvimento intelectual. São atividades que comumente atuam no fortalecimento do hipocampo, no armazenamento da memória, bem como o realçam as funções do sistema límbico, que ajuda na fixação das memórias de longo prazo.
2) A postura bípede iria modificar dramaticamente a forma com que o indivíduo experimentava o mundo. De modo irreversível, ela implicaria em novos desafios para seu cérebro até então pouco exercitado em seu incipiente raciocínio. Vários órgãos sofreriam adaptações evolutivas a fim se adequar aos novos aspectos da recente realidade da espécie. Agora era possível exercitar suas potencialidades sensitivas simultaneamente e de forma independente. Não era mais necessário parar para ouvir, deixar de observar o perímetro para se alimentar, como ocorre com outras espécies. Agora era possível processar cognitivamente informações sensoriais diversas, cultivar simultaneamente todos os sentidos e manter-se em permanente estado de alerta. Esse exercício poli - sensitivo, que também pode ser atribuído à condição ereta, surgiria involuntária e gradativamente, possibilitando a construção de novas conexões neurais nas áreas da visão, locomoção motora, percepção de estímulos auditivos e memória, além das percepções espaciais e outras relacionadas ao clima, ao tato e o mundo exterior de modo geral. Desta forma, com o passar dos séculos, se daria a construção de estruturas de mediação essenciais para a coordenação da atividade cerebral como um todo. Esta percepção leva a crer que esses elementos colaboraram para o aumento do domínio do homem sobre a vida.3) Considerações importantes sobre o emprego para os braços. Com o advento da verticalização, os membros superiores deixaram de ser exigidos para a locomoção do indivíduo. Essa era uma de suas principais atribuições anteriores. Para o homem, não foi difícil compreender que estavam agora disponíveis para a realização de novas tarefas. Era necessário encontrar novas formas de emprego para estes membros que passaram a “sobrar” no corpo. Encontrar novos exercícios para esta preciosa ferramenta se traduziu numa tarefa que exigiria maiores níveis de destreza e coordenação dos membros. Explorar estas potencialidades possibilitou o surgimento de novas e inusitadas habilidades para os indivíduos. Este conjunto de novos e inusitados desafios surgidos com a disponibilidade dos membros superiores exigiria o desenvolvimento de complexas cadeias de conexões neurais, sobretudo nas áreas motoras e sensoriais. Tudo graças ao desafio de aumentar a coordenação destes membros. Como resultado, tornou-se possível a construção das primeiras ferramentas de uso contínuo feitas pelo homem, tais como lanças, lâminas de pedra e outros artefatos inicialmente rudimentares.4) A abstração em torno dessas atividades representava novos e significativos desafios para o cérebro até então pouco exigido. O exercício imposto pelos desafios da criatividade iria propiciar o surgimento de importantes cadeias de conexões no cérebro. Na medida em que novos desafios surgiam, o grau de abstração aumentava, patrocinando o surgimento da engenhosidade. O homem ensaiava os primeiros passos nas obras que realizaria a partir de então e que passariam a transformar o mundo.
5) A posição vertical possibilitou outros avanços. A destacar o assentamento do cérebro sobre o cerebelo e a coluna vertebral. Uma perfeita distribuição entre os hemisférios e as áreas sensíveis. Como resultado, maior equilíbrio do peso da cabeça em relação ao resto do corpo, algo fundamental para a estabilidade e manutenção da posição ereta. Em particular, este aspecto da postura bípede pode representar forte vínculo entre o aumento do volume do cérebro, somando-se à outros elementos, em decorrência da necessidade de estabilizar o corpo em sua nova posição. O alinhamento com a medula espinhal com o tronco encefálico, que está diretamente relacionada com o andar ereto, favoreceria habilidades nesta nova posição, sobretudo a facilidade de administrar sentidos simultaneamente. Com esta nova configuração, a rede nervosa que se espalha pelo corpo passa a se beneficiar diretamente da nova arquitetura e pode a contar agora com um a configuração otimizada. De mesmo modo, ocorre o favorecimento da distribuição das artérias, sendo otimizado o transporte de gases, nutrientes e oxigenação do corpo, favorecendo a eficiência do sistema nervoso central como um todo.
A verticalização plena favoreceria a eficiência das áreas de associação pré-frontal, através dos sinais transmitidos ao córtex motor através da medula espinhal e do córtex corticoespinal, onde uma importante cadeia de vias sensoriais se fortaleceu. O alinhamento da medula espinhal com o tronco encefálico, o cerebelo e o córtex passou a ocorrer na posição vertical (sofrendo a ação da gravidade) por períodos estimados entre catorze e dezesseis horas, restando outras oito ou dez horas na posição horizontal, representada pelo período de repouso médio do ser humano. Não é possível precisar a existência de espécies na natureza que experimentam essa duplicidade de postura ao longo de um dia. Apenas alguns tipos de macacos vivenciam em parte esta experiência. Entretanto, o ângulo de sua verticalidade ainda é em muitos graus inferior ao ângulo da verticalidade humana.
6) A postura bípede e a fala. Em alguns milhares de anos de experimentação, esta nova configuração favoreceria ainda o desenvolvimento de outras potencialidades humanas. A fala pode ser diretamente relacionada com o processo de verticalização. Este processo certamente interferiu em praticamente todas as características relacionadas com esta fantástica característica humana. A começar pelas cavidades do trato vocal, sobretudo com a descida da laringe, que curiosamente ainda se encontra numa posição primitiva num feto dos dias de hoje. A expansão das fossas nasais, que desobstruiu consideravelmente o espaço entre a língua e a laringe, alinhando-a com a faringe e a traquéia, mudando para uma posição que permitiu que se elevasse gradativamente à altura do palato duro, ou o céu da boca. O desenvolvimento destas potencialidades provocaria as primeiras manifestações de funções intelectuais relacionadas, uma vez que o enriquecimento da experiência sensorial e todo o seu conjunto gestor se tornariam cada vez mais capazes de converter equivalentes lingüísticos e interpretativos em memória. Assim, o armazenamento de informações auditivas, visuais e táteis se tornou um exercício a ser processado, convertido em memória e posteriormente transmitido na forma de linguagem.
Um número considerável de transformações teria ocorrido ao longo de milhares de anos. Mudanças que favoreceram de forma extraordinária a otimização do fluxo de ar entre as vias aéreas inferiores e superiores, além de beneficiar o espaço para as cordas vocais, viabilizando combinações mais ricas de recursos destes membros. Seria possível ainda afirmar que este conjunto de transformações tenha interferido na capacidade respiratória, na coordenação entre a respiração e o funcionamento moderador do diafragma, o que teria viabilizado a vocalização de sons cada vez mais complexos, permitindo o enriquecimento de todo o sistema.
Assim como em outras espécies, o ser humano não possui um aparelho fonador especifico. Sua potencialidade em produzir diversos tipos de som é na verdade uma adaptação de órgãos que fazem parte do sistema respiratório e digestivo. Talvez em função desta característica bastante peculiar do aparato fonético humano, estudiosos da ciência cognitiva da linguagem tenham encontrado tanta dificuldade para chegar a um consenso sobre a modulação da fala. Divididos em correntes de pesquisa, pesquisadores divergem entre si sobre a existência de genes ou módulos cerebrais destinados para a linguagem. Sem entrar no mérito das competências lingüísticas, é possível deduzir que a fala tenha sido uma das últimas conquistas advindas do evento da verticalização. Embora simplista esta associação entre a verticalização e a potencialização da adaptação de órgãos para produção da fala desfruta de crédito consensual em meio às correntes ideológicas distintas do debate acadêmico. Dando prosseguimento ao raciocínio, vale destacar que, de mesmo modo que outros fenômenos decorrentes desta transformação, a vocalização e memorização de sons específicos contribuiriam largamente para a construção de novas e significativas conexões neurais.
Em função do enriquecimento das conexões cerebrais decorrentes das inúmeras transformações ocorridas com o advento da sua verticalização, o homem experimentou finalmente o aprimorar seus sentidos de modo geral, aprofundando o nível de sua percepção do ambiente. O alinhamento do sistema nervoso central (encéfalo = cérebro, cerebelo, tronco encefálico + medula espinhal) com o sistema nervoso periférico (constituído por nervos que emergem do sistema nervoso central) resulta num invejável centro de inferências entre as diversas terminações nervosas envolvidas nas sofisticadas funções físicas e cognitivas observadas no homem então. O exercício contínuo de novas experiências patrocinadas pelo advento do bipedalismo lhe possibilitou extrapolar os limites da plasticidade neural se comparado aos seus ancestrais não bípedes. Permitiu-lhe ainda acumular a reter maior volume de informações interiores e exteriores em sua consciência, favorecendo o franco desenvolvimento de suas habilidades intelectuais com o aprendizado angariado com o passar dos tempos e transmitido entre seus descendentes. Geração após geração.
Uma consideração muito importante diz respeito à condição da posição bípede e os diferentes graus de verticalização experimentados pelo homem ao longo do processo que culminaria na posição ereta plena. Esta relação vem a ser crucial para a defesa de que os benefícios alcançados com a posição ereta plena possam ser associados à aquisição da inteligência. O término do processo da verticalização significou o ápice da adaptação bípede, assim como resultou numa maior conferência entre os membros inferiores e superiores, possibilitando a estabilidade do corpo através de suas novas proporções. Definitivamente, esta nova condição demandou centenas de alterações ou adaptações em praticamente todas as partes do corpo, desde a posição dos dedões dos pés, passando pela musculatura e ossatura das pernas, quadris e abdômen, até as partes superiores do corpo. Não seria difícil supor que o assentamento do córtex cerebral, ocorrido em função da condição ereta, tenha sido um fato capaz de acarretar uma série de mudanças em suas características anatômicas corticais. Uma das primeiras possibilidades diz respeito ao seu volume, aumentado em virtude do equilíbrio e estabilidade de um corpo ereto. Esta transformação ocorreu interna e externamente, alterando as formas cranianas, as feições da face e mandíbulas.
Quanto ao ambiente interno do córtex, são necessárias novas considerações sobre as alterações organizacionais dos hemisférios e suas subdivisões. Sobre a forma que se acomodaram e que aspectos de seu funcionamento possam ter sofrido alterações ou mesmo assumido novas funções adaptativas, a começar pela área motora do córtex motor primário. Que avaliações podem ser feitas sobre o impacto da condição ereta e a demanda por novas formas de gerenciamento dos movimentos de um corpo ereto?
Considerando que todos os órgãos e sistemas estão de alguma forma ligados ao sistema nervoso central, que benefícios ou grau de otimização a condição ereta teria ocasionado à distribuição das terminações nervosas? Estes são apenas alguns fatores implicadores que merecem novas abordagens, assim como alguns aspectos relevantes sobre alterações ocorridas nas junções neuromusculares onde ocorre sinapse entre os neurônios e as células musculares. Ou na área de associação pré-frontal do córtex motor primário, que atua sobre o controle dos pés, mãos, boca, etc. além dos músculos da fala e de todos os movimentos voluntários. O andar bípede ainda geraria demandas importantes para a área pré-motora do córtex, responsável pelo planejamento e coordenação de movimentos mais complexos. Outras comparações importantes sobre possíveis alterações funcionais podem ser aplicadas à área de broca, área somatosensorial, área de associação límbica, etc.
Seguindo em direção oposta, do córtex para baixo, cabe ressaltar as mudanças ocorridas com o alinhamento da medula espinhal e o tronco encefálico por onde trafegam os sinais do córtex motor até o segmento medular e especular de que forma a configuração ereta possa ter contribuído para a eficiência do sistema como um todo, uma vez que esta área é responsável pela postura ereta e o equilíbrio.
Mesmo supondo que as alterações ocasionadas pela verticalização não tenham tido grande influência na especialização ou aprimoramento das áreas do córtex, não seria possível ignorar a forma diferente com que o indivíduo passou a experimentar o mundo a partir das mencionadas transformações sofridas pelo corpo. Estas diferenças exigiram um alto grau de adaptação e memorização. Um fato que por si só implica a retenção de informações bastante complexas. Considerando que as memórias são geradas fisiologicamente a partir da variação da sensibilidade sináptica entre os neurônios e que estas variações são responsáveis pela criação de novas vias para a transmissão neural, conhecidas como traço de memória, torna-se possível supor que as transformações aqui descritas representam mesmo uma revolução nos hábitos ancestrais com o enriquecimento de possibilidades sugeridos pela condição ereta.
Considerando que não seria apenas uma mera coincidência o fato de o homem ser o único animal inteligente e plenamente vertical, ou que o fato de a inteligência ter começado a se manifestar na espécie justamente após a aquisição do andar bípede, seria ainda possível enumerar centenas de elementos que corroboraram para o enriquecimento das funções do córtex que podem ser diretamente relacionadas à condição ereta do homem.
Voltando o foco para outros aspectos do desenvolvimento humano, torna-se perfeitamente possível vislumbrar que vários eventos tornaram-se componentes importantes para a orquestração de uma fantástica convergência para a inteligência. Sabe-se que o homem tem uma origem comum na África. De lá, representantes migraram através dos continentes em busca de melhores condições de sobrevivência. Alterações climáticas e geológicas interromperam as ligações entre alguns continentes, de modo que as populações que neles se encontravam ficaram isoladas de outros povos. Estes acontecimentos limitaram a diversidade genética aos pequenos grupos agora isolados territorialmente.
Habitantes de diferentes regiões passaram a enfrentar realidades diversas de outros grupos, tais como as condições climáticas e o tipo de alimento disponível nas terras que ocupavam. Estas diferenças, entre outras, como o isolamento hereditário, seriam responsáveis pelas alterações que caracterizariam a diferenciação entre raças de humanos, como os negros, asiáticos e caucasianos.
Entretanto, o amadurecimento do fruto do bipedalismo tornara-se algo irreversível e não está consignado à outra condição, senão o bipedalismo. A inteligência, independente da região do globo onde o homem se encontrava, começaria a se manifestar quase simultaneamente nos indivíduos. Pinturas rupestres, confecção de ferramentas de uso contínuo, novas técnicas de caça e até mesmo o uso do fogo são procedimentos adotados pelo homem praticamente ao mesmo tempo e em regiões diferentes. Estes vestígios foram encontrados na África, Europa, Américas e Ásia e as datas onde se inauguraram estas práticas são realmente bem próximas. Isso significa que a inteligência começava a se manifestar simultaneamente no homem, independente da raça, da região que habitava, do tipo de alimento a que tinha acesso ou de mutações sofridas por outros povos isolados exatamente como um processo de maturação.
Processos semelhantes ocorreriam daí em diante registrando evidências realmente marcantes. As transformações das vias aero respiratórias decorrentes do bipedalismo possibilitaram a sofisticação da vocalização de sons. O enriquecimento das formas de comunicação que culminariam na fala contribuiu para uma coesão cada vez maior dos grupos. Ao mesmo tempo, possivelmente em decorrência do isolamento territorial, o homem se viu forçado a desenvolver novos procedimentos para a obtenção de alimentos. O domínio de técnicas de agricultura e pastoreio diminuiu a necessidade de migrar e aos poucos, pôs fim ao nomadismo. A adoção do sedentarismo exigiria novas formas de organização do grupo, visando à distribuição de tarefas e papéis nesta que seria uma forma incipiente de sociedade. A fala seria o instrumento catalisador de todas estas transformações, possibilitando o emergir de lideranças articuladas e capazes de organizar grupos cada vez maiores. Estas sociedades mais complexas podem ser definidas como os embriões do Estado. O amadurecimento do fruto do bipedalismo pode ser compreendido como a explosão da inteligência, que teria ocorrido simultaneamente em todo o globo, apesar do isolamento geográfico dos povos. Este isolamento serviu apenas para distinguir a maneira com que cada grupo lidaria com seus desafios.
Uma vez isolados, cada grupo teve de encontrar soluções próprias para diferentes situações. A começar pelas possibilidades vocais, cada grupo desenvolveu sua própria forma de linguagem, dando origem a idiomas bastante diversos. De mesmo modo, cada grupo enfrentou o desafio de desenvolver suas próprias formas de governo, religião e cultura. Algumas destas soluções primordiais prevalecem até os dias de hoje em vários países.
Conforme destacado anteriormente, as referências sobre inteligência contidas no texto a seguir não perseguem absolutamente nenhuma forma de definição sobre o significado da mesma. O texto tampouco se propõe a discutir o mérito de classificações sobre o intelecto e as formas superiores de cognição.
Considere-se a inteligência apenas sob o ponto de vista do senso comum, como um fator que difere o homem de outros animais, cuja origem representa o foco deste estudo. Torna-se importante salientar ainda que esta teoria não sugere a visão simplista de que o advento do bipedalismo isoladamente seria capaz de ocasionar mutações instantâneas nos indivíduos. As transformações mencionadas teriam sido em decorrência da adoção da posição ereta e da adaptação gradativa de seus dispositivos físicos a esta configuração, que teria consumido milhares de anos até o ponto de sua efetivação.
A tarefa de relacionar aspectos relevantes da capacidade cognitiva com o advento do bipedalismo requer uma análise depurada de elementos fundamentais para a produção do raciocínio.
Considerando que as potencialidades cognitivas tenham se originado no homem primitivo por algum outro motivo, que fator teria sido preponderante para a aquisição de tais possibilidades, senão algo capaz de interferir na organização funcional de todo o sistema nervoso? As alterações ocasionadas nas condições neurais pela conquista do andar bípede perecem, por si só, suficientemente capazes de patrocinar mudanças significativas o bastante para provocar resultados surpreendentes na funcionalidade do sistema como um todo. Logo, conceber que houve mudanças dramáticas em praticamente todos os níveis de hierarquia do córtex consiste num raciocínio meramente elementar dado as consistências das evidências enumeradas. O assentamento do córtex sobre o cerebelo e o seu conseqüente alinhamento com o sistema nervoso central pode ser um bom começo para a defesa dos argumentos aqui sugeridos. Conhecido como a área silenciosa do cérebro, o cerebelo é o responsável por uma série de movimentos do corpo, apesar de estímulos elétricos nesta área não serem capazes de provocar sensações conscientes ou mesmo desencadearem movimentos motores. A adoção do bipedalismo tem como principal conseqüência o enriquecimento da postura e de uma cadeia de novos movimentos que envolvem particularmente esta parte do cérebro, que atua em sintonia com o córtex cerebral e o tronco encefálico no gerenciamento de uma série de funções relativamente complexas, considerando as condições de exercício desta área antes da adoção do bipedalismo. Esta nova postura exigiria demandas inéditas para esta área silenciosa, mas de vital importância para a coordenação e planejamento de movimentos complexos de um corpo ereto e a recente disponibilização dos membros superiores. A necessidade de encontrar emprego para as mãos e os braços consistiu-se numa tarefa que exigiu esforços grandiosos para este relevante setor da anatomia cerebral ao longo de milhares de anos. Progressivamente, o cerebelo precisou aprender a coordenar seqüencialmente milhares de novos movimentos a fim de fornecer informações atualizadas ao córtex motor. O incremento da atividade envolveria ainda outros módulos coadjuvantes do sistema motor, como os gânglios de base. Localizados na base do cerebelo, atua como elemento complementar do sistema motor associado ao sistema corticoespinal no gerenciamento de atividades motoras mais complexas. É possível considerar que o córtex cerebral como um todo sofreria dramáticas transformações ao longo de todo o processo da adaptação bípede. Uma das principais mudanças que pode ter ocorrido diz respeito ao seu volume. A posição ereta exigiria maior grau de equilíbrio e estabilidade do corpo. Este fator pode ter sido de grande significado para o aumento da massa cerebral até o volume observado na atualidade. Neste caso, Tanto a necessidade de estabilizar um corpo ereto quando a demanda por novas cadeias neuronais para gerenciar o aumento do fluxo de informações podem significar fatores que tenham contribuído para o aumento significativo do volume do cérebro. A condição ereta implica pode ser traduzida como fator que exigiu dramáticas mudanças na arquitetura neural, significando uma quantidade enorme de diferenças em relação à postura primitiva. De acordo com esta nova perspectiva, o indivíduo passou a contemplar áreas mais extensas. Este perspectiva sugere a ampliação dos horizontes, o dimensionamento de seus domínios, além de significar mais exercícios para o lobo occipital com o gerenciamento das novas informações visuais. A percepção de um horizonte mais amplo exigiria ainda maior atividade nas áreas motoras, além de exigirem maiores volumes de memorização do território e suas características. A necessidade de retenção destas informações resultaria em atividades extras para o hipocampo e o sistema límbico com a consolidação dos dados apreciados. A memória instantânea perdia espaço para as memórias de curto, médio e longo prazo. Exatamente aqui começa a ocorrência da reorganização morfofuncional do neurônio, onde cresce o volume não apenas dos traços de memória. Na mesma medida, crescem também o número de receptores e de neurotransmissores. Este aumento não decorreu apenas do enriquecimento das informações visuais, mas de todo um conjunto de novas informações a serem armazenado, tais como a avaliação de tempo, distância, gasto de energia para alcançar determinadas planícies e outros parâmetros relacionados com a exploração planejada do ambiente. Coordenar a seqüência correta de inusitadas atividades motoras corresponde a um exercício que exige concentração, planejamento e aprimoramento contínuo. A diversidade de novas posturas e o exercício de movimentos cada vez mais complexos são também fatores responsáveis por grande parte da sofisticação das áreas motoras do córtex envolvidas no aprendizado de novos movimentos. Estas novas demandas não estão limitadas apenas às modificações no modo de andar, correr ou flexionar o corpo ereto. Decorrem ainda do desafio representado por ter de encontrar novas formas de utilização dos membros superiores. A possibilidade de adaptar o mundo ao invés de se adaptar a ele sugeriu a necessidade de conceber formas engenhosas de transformação do ambiente. Os braços e as mãos passaram representar as principais ferramentas a serem empregadas. A princípio, a produção de ferramentas rudimentares, apetrechos para caça e aproveitamento de peles. Considerando os aspectos de excelência natural da aquisição da inteligência, entende-se que os até então elementos relacionados estimulariam o aumento contínuo da capacidade cognitiva dos indivíduos. Na mesma medida, o aumento desta capacidade seria correspondido pelo aumento gradativo das habilidades manuais, resultando na sofisticação das técnicas empregadas para a confecção de vários artefatos. A engenhosidade de alguns indivíduos sugeria o despertar da criatividade entre os demais integrantes do grupo, sob a forma de aprendizado por imitação. Observar que era possível adaptar o ambiente de acordo com as possibilidades parecia bem mais estimulante do que tentar se adaptar ao mundo da forma que ele se apresentava. Aos poucos, tudo aquilo passou fazer algum sentido em face da aplicação prática dos implementos até então desenvolvidos. Começava ali uma jornada irreversível em direção ao progresso.
NOTA: Algumas sugestões decorrem da avaliação de aspectos relevantes mencionados. Logo, as evidências que sustentam os argumentos desta pesquisa podem ser classificadas de acordo com a relevância e credibilidade das fontes pesquisadas. Os dados prospectados estão inscritos nos vários cenários reconstituídos por estudos consistentes em diferentes áreas da ciência. Elementos angariados ao longo de séculos por minuciosas pesquisas em áreas como história natural, arqueologia, antropologia, paleontologia, fisiologia e neurociências foram de fundamental importância para a composição desta teoria. Estes estudos corroboraram para a consolidação de um panorama bastante plausível sobre os possíveis fatores que tenham contribuído para a aquisição da inteligência humana. O trabalho consiste na iniciativa de vincular aspectos significativos da evolução, descortinados anteriormente por outros estudos. Deste modo, compreende-se que o resultado desta investigação pode ser resumido como uma associação dos fatos mais relevantes da evolução da espécie humana, convergindo para o evento da aquisição da inteligência. Os pilares de sustentação dos argumentos aqui defendidos são justamente os vínculos providenciais citados no decorrer dos estudos, ficando a cargo de especialistas de cada área envolvida a certificação das informações.
Talvez tenha ocorrido numa noite de rara beleza, repleta de estrelas, onde um astro cadente escrevia sua derradeira trajetória através de um inebriante rastro de luz no céu. Um observador anônimo pode ter se emocionado com aquele singelo momento e tenha tentado erguer o próprio corpo com a esperança de tocar a lua no firmamento. O que ele não imaginava era que aquele inocente gesto de esperança seria o responsável pela fantástica jornada que seus descendentes empreenderiam a partir de então. E foi assim, com os pés no chão e a cabeça nas estrelas que a humanidade alcançou a lua, tão desejada no passado por um distante e desconhecido representante de nossa espécie.
Alirio Freire
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